Paulo Vasco rejuvenescido com a revista “Humor com Humor se Paga”

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paulo vasco

Carinhosamente chamam-lhe “o cota” da companhia, por ser o mais velho, mas também o mais experiente ator do elenco no qual se encontra inserido. No entanto, Paulo Vasco, 52 anos, actor desde os 17, afirma que pertencer ao elenco desta Revista o rejuvenesceu 20 anos, por estar em contacto com jovens bastante talentosos com os quais aprende muito todos os dias.

Na entrevista que nos concedeu falou-nos das suas memórias, do privilégio que foi ter trabalhado com grandes senhores do teatro português e da angústia que sente ao ver grandes palcos por onde passou irem desaparecendo aos poucos.

Crente em Deus, Paulo acredita que a vida é uma dádiva constante e que recebemos na medida em que damos. E talvez por ser também ele um grande senhor do teatro português mereça receber muitas dádivas.

A última delas é fazer parte do elenco da peça “Humor com Humor se paga”, em cena na fábrica dos sonhos, o teatro Maria Vitória, que celebra em 2013 90 anos de existência.

 

A primeira vez que pisou o palco do Maria Vitória foi há mais de 20 anos. Mas antes disso já tinha pisado outros palcos. Fale-nos do início da sua carreira como ator.

Antes de me tornar um ator profissional, eu já tinha feito um trajeto no teatro amador onde ganhei um prémio. Foi esse reconhecimento do meu trabalho que me abriu as portas para o teatro profissional.

 

Lembra-se da primeira vez que pisou um palco como ator profissional?

 Estreei-me como ator profissional no Teatro Laura Alves, na Rua da Palma, que infelizmente já não existe. Aliás,tal como a maior parte dos teatros em cujos palcos já representei.

 

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É uma grande mágoa ver os teatros em que já representou desaparecerem?

É sem dúvida. No que toca ao teatro Laura Alves foi de fato uma grande dor porque era um teatro fantástico. Na altura foi vendido, transformaram-no numa loja de alguidares e mais tardenuma pensão que acabou por arder.

 

Curiosamente, antes de vir para o Maria Vitória ainda pisa primeiro o palco do Teatro Variedades.

Exatamente. Entrei no Teatro Variedades com uma comédia musical infantil. Era uma comédia do senhor Henrique Santos. Dois anos depois estreei-me aqui, com a revista “Quem tem Ecu tem medo”. Embora com algumas ausências pontuais, grande parte da minha vida tem sido passada aqui, no Maria Vitória.

 

O bom filho à casa volta. Porquê?

Não sei. Se calhar é porque tenho um grande amor por esta casa. Foi ela que me deu aquilo a que eu chamo de estatuto, porque embora eu tenha feito outras coisas, nomeadamente televisão, continuo a achar que o teatro é a montra de um artista. Saí daqui para ir para o Politeama fazer o musical “Amália”, regressei para fazer o“2001 Odisseia no Parque”, e por cá me tenho mantido.

 

Ao longo destes 20 anos, o que é que mudou no teatro em Portugal?

O teatro não é uma arte estanque, é uma arte que tem que evoluir e adaptar-se à sociedade. Ainda sou do tempo em que se faziam duas sessões diárias e três ao domingo. Hoje em dia apenas se faz quinta, sexta, sábado e domingo, sendo que sábado e domingo são duas sessões. Mas claro que o teatro foi acompanhando todo um processo de modernização. Lembro-me que já fiz peças em que eu tinha que segurar no micro para cantar. Hoje em dia não, temos todos micros ultra modernos. Como no estrangeiro. (risos) Antigamente os atores tinham de esforçar muito mais a voz. Atualmente o esforço é menor embora tenhamos de manter o tom na representação.

 

Acha que os atores hoje em dia têm o mesmo valor dos atores desse tempo?

Claro que sim. Esta revista, por exemplo, tem muita juventude e, eu que sou o “cota” da companhia, como eles dizem, tenho de me aprimorar para chegar à altura deles. Dou-lhes muitos conselhos, mas também aprendo muito com eles. Temos aqui gente de muito valor.  São muito jovens, mas já têm um caminho percorrido em televisão e em teatro.

 

No texto que escreveu para o livro de apresentação da peça dizia que com esta peça, por ter tantos jovens, rejuvenesceu 20 anos. Sente mesmo isso?

Claro.Aliás sinto-me rejuvenescido e mais gordo (risos). Rejuvenescido porque as coisas alteram-se. Aprendemos um certo e determinado estilo de representação e esta malta nova, que tem sangue na guelra, representa de forma diferente. A experiência, juntamente com a força da juventude, encaixa nesta revista na perfeição.

 

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É isso que esta revista tem de especial?

Esta revista tem várias coisas especiais. Além da juventude, tem uma montagem tremenda, que em tempo de crise, só posso dizer que o Costa (Hélder Freire Costa), perdeu a cabeça. Fazer uma montagem destas numa altura de crise é muito complicado, pois tem que se fazer uma ginástica financeira muito grande. Quando as pessoas dizem que o teatro está envelhecido é mentira, pois temos tido muitos grupos de jovens que vêm ao teatro.

 

Então concorda que os jovens se interessam cada vez mais pelo teatro?

Sem dúvida. A televisão contribuiu muito pelo fato de transmitir as peças. Houve uma aproximação maior do teatro às pessoas e despertou o interesse por esta arte. Conheço muito bem este nosso país e sei que cada vez mais nascem grupos de teatro amador, que era algo que estava adormecido, e depois de um momento para o outro começaram a surgir. Ou seja, começaram a representar aquilo que viam na televisão e começaram também a querer vir ver ao vivo e obrigavam os pais a vir.

Esta geração, que está a ganhar novamente o gosto pelo teatro, tem mais acesso a esta arte, do que por exemplo o Paulo tinha na idade deles?

Não tenham dúvidas. A minha geração não ia ao teatro. Eu sou de uma geração, antes do 25 de Abril, em que os espetáculos eram para maiores de 18 anos e as comédias para maiores de 16, portanto nós não podíamos ir ao teatro.Quando aconteceu o 25 de Abril eu tinha 14 anos e só vi uma comédia. Foi uma comédia que vi no Capitólio, com o senhor Camilo de Oliveira, que me deixou logo apaixonado por teatro.

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E depois do 25 de Abril?

Depois do 25 de Abril tive a sorte de começar a ver Teatro de Revista. A primeira Revista que vi foi no Monumental, uma Revista colossal chamada “Lisboa acordou”, que tinha um elenco e uma montagem de luxo. Foi esse o despertar em mim, foi aí que eu disse, “é isto que eu quero fazer”.

 

E na família, não tinha ninguém ligado às artes?

Sempre vivi lado a lado com o teatro. O meu avô era músico. Antigamente usava-se muito nas orquestras o banjo e ele tocava esse instrumento. Um dia o meu avô foi contratado para ir para o Maxime e chegou a fazer revistas no ABC.
Era um grande artista, que fazia sempre os papéis dramáticos e até há uma história muito engraçada, que ele contou no livro que escreveu, em que refere um episódio onde está a interpretar o papel de um sujeito que acaba por morrer e a minha bisavó na plateia desata aos gritos: “Filho não, por favor não morras”. Depreende-se deste episódio que devia saber morrer tão bem que até a mãe achou mesmo que ele estava morto. 

Se ele fosse vivo teria certamente muito orgulho em si e no seu percurso.

Penso que sim. Onde quer que ele esteja, tem de certeza uma luzinha a iluminar-me. Comecei a vir ao Parque muito cedo e aquilo que mais me fascinava eram as luzes lá fora a acender e a apagar. Depois chegava a casa, recortava as fotografias dos artistas do jornal e fazia os cartazes à minha maneira. Aproveitava as peças que vinha ver, e quando chegava a casa recriava-as em miniatura. Cheguei a fazer palcos com caixas de sapatos. (risos) Até que depois fui para o teatro de Carnide, onde fiz peças com algum peso.

 

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E foi no Teatro de Carnide a sua primeira experiência em teatro?

Sim, foi a minha primeira experiência. A primeira peça que eu fiz foi “A Cotovia”, de  Jean Anouilh, onde só fazia figuração. Depois disso fui dirigido por grandes senhores do teatro como é o caso do Bento Martins e o Bernardo Santareno. Fiz também o Rei Leão de Shakespeare. Ou seja, peças que me deram alguma estaleca pois, na minha opinião, o Teatro de Revista é dos géneros mais difíceis de se fazer. Tem que haver uma certa empatia entre o público e o ator.

 

Acha que é mais difícil fazer rir do que chorar?

É. Especialmente no momento que estamos a atravessar, porque as pessoas vêm pesadas. Esta revista está preparada “para ir aquecendo o público”. A abertura é para os relaxar, com o aniversário do Maria Vitória, esta fábrica de sonhos que está aqui aberta há 90 anos e depois vai subindo até ao final que é fantástico e o público tem reagido muito bem.

 

Considera-se um homem realizado e feliz por fazer Teatro de Revista?

Tive a sorte de ter grandes textos nesta Revista. Textos que marcarão, um dia mais tarde, o Teatro de Revista. Considero-me um homem de sorte porque tenho trabalhado com excelentes autores. Neste momento é o Mário Rainho, que é um excelente autor e encenador, mas tive também o Henrique Santana, do qual não me posso esquecer pois aprendi muito com esse grande mestre. Trabalhei aqui com grandes senhores; o Francisco Nicholson ensinou-me muita coisa, com o Norberto Barraca aprendi muito. Portanto foram as pessoas com quem trabalhei que me fizeram um ator melhor. É preciso ter um bocadinho de sorte.

 

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Sorte e talento…

Também. Mas é uma questão de se amar muito aquilo que se faz, porque tudo aquilo que é feito com o coração vem sempre ao de cima. As emoções vêm muito mais ao de cima do que se forem feitas simplesmente porque se precisa de ganhar dinheiro. Essa não é a minha política.

 

Não é o dinheiro que o move?

Se eu quisesse ganhar muito dinheiro, se bem que agora já não há muito (risos), estaria na televisão, a fazer telenovelas, ou os Morangos com Açúcar, ou a Casa dos Segredos, ou sei lá eu o quê. Mas são coisas que eu nego logo à partida. Simplesmente não faço.

 

Tendo que optar, optaria sempre pelo teatro?

Sempre, porque a televisão desgasta muito a imagem do ator e também nos desgasta fisicamente. Uma pessoa ter que se levantar todos os dias muito cedo, sair de lá não se sabe muito bem a que horas, decorar os textos para o dia que se segue… A televisão é uma máquina de triturar. Antigamente fazia televisão porque compensava monetariamente, hoje em dia já não. Aqui há tempos fui convidado para fazer um determinado programa, e quando me falaram em cachet, não disse logo que não, mas disse que não podia porque estava ocupado. Isto porque eu ia ganhar o mesmo que ganhava quando comecei. Não vale a pena o esforço.

 

Mas neste momento há alguma coisa em televisão que gostasse de fazer?

Gostava imenso de ter feito a série “Conta-me como foi”, porque é uma série muito bem feita. Mas há cada vez menos produções dessas. E tal como já disse o teatro é a montra de um artista. Todos os grandes atores começaram no teatro. Atores que neste momento estão em televisão, como é o caso da Marina Mota, Maria João Abreu, Carlos Cunha, José Raposo, entre outros, começaram aqui. Muitas vezes vêem aqui, (no teatro) os atores e contratam-nos para televisão.

 

Já aconteceu isso consigo?

Já. Por exemplo, quando fui contratado para fazer os “Malucos do Riso”, foi aqui. Estava cá o produtor que me perguntou se eu não estava interessado em fazer essa série. Aliás, foi o elenco todo contratado aqui. Nós nunca sabemos quem é que está na plateia.

 

Se hoje estivesse na plateia alguém que gostasse do seu trabalho e lhe desse verba para levar a cabo o projeto da sua vida, que projeto seria esse?

Das duas uma, ou tirava férias vitalícias e entretinha-me a fazer dinamização de pequenas coletividades, ou então comprava um teatro. Neste momento dirijo um grupo, “Os Combatentes”, num palco centenário, que existe ali nos Prazeres, onde começaram grandes nomes do teatro português como a Aida Batista, a Maria Clara, o Tony de Matos…. Quando me convidaram para ir para lá fiquei todo contente pois ia dinamizar um palco de pessoas que eu admirei muito. Para mim a Aida Batista foi das maiores vedetas do Teatro de Revista. Sentir aquele palco e saber que eles o pisaram para mim é muito bom. Por isso se calhar se tivesse dinheiro fazia sem dúvida dinamização de teatro. Mas nunca deixaria o teatro pois a vida sem teatro é demasiado triste. Aqui passamos duas horas e meia onde esquecemos os problemas, divertimo-nos e divertimos os outros.

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Até que ponto o Teatro de Revista ajuda as pessoas na conjuntura atual?

Recebemos aqui pessoas, às vezes, com graves problemas de saúde, graves problemas financeiros, que vêm agradecer as duas horas e meia que passaram aqui connosco, pois esqueceram por momentos esses problemas. E isso é uma dádiva. Sinto-me feliz por isso.

 

Acha que também faz parte da missão de um ator ajudar os outros?

Eu sou uma pessoa de dádiva. Gosto de dar. Sou voluntário no Hospital de Santa Maria porque acho que a sociedade tem que ser feita assim. As pessoas que estão hoje na mó de cima, não quer dizer que não venham a estar na mó de baixo mais tarde. E a minha teoria é essa, quanto mais ajudarmos, mais ajudados poderemos ser, e já tive muitas provas disso na minha vida. Sou um crente em Deus e acho que já fui compensado com coisas muito bonitas. O sucesso desta revista,por exemplo, é a prova dessa recompensa.

©starsonline      

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